quarta-feira, 27 de novembro de 2013

O mito de Sísifo… “Quanto mais se economiza a vida, mais se encontra a morte”

(Texto do Prof. Dr. Viktor de Salis)

O mito conta-nos que Sísifo era o mais astuto dos mortais e o menos escrupuloso. Amava a vida, com todos os prazeres materiais que ela lhe pudesse oferecer, sendo sua maior tristeza saber que haveria de morrer deixando tudo aqui. Era filho de Éolo e este pertencia à raça de Deucalião e Pirra, considerados a origem da raça dos homens mortais. Era ainda fundador de Corinto e pai de Odisseu.
Traiu Zeus ao revelar uma de suas aventuras, quando este raptara Égina, filha do deus rio Asopo, dando-lhe a nascente de um rio para Corinto em troca. Zeus já estava encolerizado com Sísifo, pelo seu hedonismo (buscava o prazer na vida como um fim em si mesmo) e com seu desdém pelos deuses. Decidiu então enviar-lhe a Morte como castigo, mas o astuto Sísifo, apercebendo-se de sua aproximação, conseguiu aprisioná-la. Assim, não só ele, mas todos os mortais puderam continuar vivendo indefinidamente.
Acontece que o Hades (o mundo subterrâneo dos mortos) era um lugar por onde passavam e depois partiam em direção a seu astro guia, para se preparar para voltar a viver. Desse modo, lá não permaneciam, sendo que esse mundo devia receber sempre novos mortos para habitá-lo. Como a Morte estava aprisionada, os homens deixaram de morrer, o que acabou por esvaziar esse tenebroso local. Hades ou Plutão, que governava esse mundo, queixou-se para Zeus de que seu reino estava praticamente vazio; este imediatamente descobriu o ardil de Sísifo em aprisionar a Morte. Decidiu então dar-lhe o mais terrível dos castigos: fulminou-o com seu raio e após libertar a Morte, aprisionou-o no Hades condenando-o a eternamente rolar uma pedra colina acima e, quando esta estivesse quase no topo, ela rolasse abaixo para tudo começar de novo.
E aqui encontramos o significado central desse mito. A pedra rolando eternamente e sendo levada novamente colina acima simboliza a mais inglória das tarefas: é inútil rolá-la acima, pois ela retornará ao seu ponto de partida; mas, embora sem sentido, deverá rolá-la novamente. Isto representa o pior dos castigos que um homem pode ter: realizar um trabalho de modo insano e sem sentido. Para o pensamento antigo isto tinha um significado ainda maior. Permanecer no Hades, sem poder retornar para seu astro guia e voltar a viver, era o pior dos castigos, pois significava perder o mais sagrado dos direitos de uma alma: o direito de prosseguir em seu destino, evoluindo cada vez mais numa nova existência, para finalmente reconquistar a imortalidade perdida. Assim, Sísifo sofre o pior dos castigos, pois perde o direito de ter um destino a cumprir. Representa a perda da busca e da evolução; tudo que ele realiza é inútil e de nada serve para a sua elevação, ao contrário, ele ironicamente atingiu a “imortalidade”. Só que da pior forma e não vai a lugar algum. Podemos compreender que, mais uma vez, esse é o sentido e o destino daqueles que estão presos ao material e à busca incessante do prazer como um fim em si mesmo: Estão condenados a não ir a lugar algum, ou seja, estão rolando uma pedra sem sentido e só eles não foram avisados.

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